A Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2025 chegou à Câmara Municipal em meio a um cenário de cortes severos, pressões judiciais e preocupações com o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. A proposta tem sido alvo de intensos debates entre os vereadores, que apontam inconsistências e dificuldades para garantir a manutenção de serviços básicos e o pagamento de servidores ao longo do próximo ano.
Diante desse quadro, uma das propostas apresentadas na sessão legislativa de quarta-feira, 4 de dezembro, é a rejeição da LOA, permitindo que o futuro governo municipal refaça o orçamento de acordo com a realidade financeira do município. Essa proposta é defendida pelo vereador Fred Procópio (MDB), que está analisando a LOA em busca de alternativas viáveis.
Fred Procópio revelou que houve discussões sobre a possibilidade de não tramitação da LOA. No entanto, após conversas entre os presidentes da Comissão de Finanças, da Mesa Diretora e outros vereadores, decidiu-se seguir os prazos regulares para emendas, permitindo que o orçamento seja analisado e, se possível, ajustado conforme desejado pelos parlamentares. Contudo, já foi deixado claro que, se não houver uma solução, a decisão será pela rejeição da matéria. “Queremos garantir um debate amplo e transparente, embora saibamos das limitações impostas pelo orçamento em sua atual configuração”, afirmou Fred Procópio.
O líder do governo Bomtempo na Câmara, vereador Gil Magno (PSD), reconheceu a gravidade do problema e concordou com a necessidade de buscar uma solução. Ele justificou os problemas orçamentários como decorrentes, em parte, da perda de repasses de ICMS, calculada em aproximadamente R$ 380 milhões anuais.
“Conversei com o quadro técnico da Prefeitura, e eles me passaram a realidade do nosso orçamento. Essa queda na receita foi provocada pelo escalonamento decrescente do ICMS, em razão daquela disputa judicial. Hoje, temos um déficit de cerca de R$ 340 milhões no orçamento, e precisamos encontrar uma solução viável pois uma saída para evitar a improbidade administrativa seria criar uma peça fictícia, que não é aceita pelo governo e não traria solução”, comentou Gil Magno. Ele sugeriu que a Câmara, os representantes do atual governo e o futuro governo trabalhem juntos em busca de uma solução conjunta.
A gravidade do cenário é tamanha que o prefeito eleito, vereador Hingo Hammes, com posse marcada para 1º de janeiro, defendeu abertamente a rejeição da LOA apresentada pela atual gestão. Segundo ele, da forma como está, não há condições de aprová-la.
Cortes na área da saúde e merenda escolar preocupam
Um dos pontos mais discutidos tem sido a drástica redução no orçamento para a saúde. Enquanto no exercício anterior a área representava 37% das despesas, a proposta atual destina apenas 22%. Apesar de questionamentos sobre a adequação dos gastos passados, o valor atual, de acordo com os vereadores, é insuficiente para cobrir despesas essenciais, como a merenda escolar. “Até mesmo a emenda para garantir a merenda enfrenta dificuldades. Sem solução, esse corte se torna insustentável”, destacou Fred.
Essa questão da merenda já foi apontada pela vereadora Julia Casamasso (PSOL), que levou a preocupação dos profissionais da área para os vereadores, pedindo que o Governo mudança a proposta de orçamento. Preocupada com o impacto da atual destinação orçamentária da merenda escolar em Petrópolis, a vereadora Júlia Casamasso chegou a enviar à Prefeitura um ofício solicitando a retificação do Projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício de 2025.
O valor destinado à alimentação escolar não é o suficiente e de acordo com o Conselho de Alimentação Escolar (CAE), orçamento para cobrir o fornecimento adequado durante os 12 meses do ano seja de ao menos R$ 40 milhões, de modo a garantir a qualidade e frequência da refeição. A proposta atual da LOA 2025 destina um total de R$ 11.505.800,00 para alimentação e transporte escolar valor que, conforme alertado pelo CAE, está significativamente abaixo do necessário para a demanda. Especialmente se considerado que R$ 6.080.000,00 provêm do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
Outro fator complicador foi uma decisão judicial relacionada ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que causou uma queda significativa na arrecadação projetada para 2025, impactando o orçamento negativamente. Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de decisão do ministro Luís Roberto Barroso, determinou que, a partir de 2025, o município devolva, ao longo de quatro anos, os R$ 380 milhões recebidos a mais em 2024. Durante esse período de devolução, haverá uma redução proporcional no repasse do ICMS para Petrópolis.
Essa situação é resultado de uma ação movida pela atual administração municipal, que buscou na Justiça uma correção na apresentação da Declam, o que favoreceu Petrópolis nos últimos anos ao aumentar sua parcela de repasses de ICMS. Entretanto, outros municípios entraram com ações contestando a mudança percentual, o que resultou na queda da arrecadação, após decisão favorável aos municípios contra Petrópolis.
Além disso, o orçamento apresenta inconsistências nos gastos com pessoal, estimados em R$ 534 milhões, valor que, segundo Fred, não cobre a atual folha salarial anual dos servidores, hoje calculada em aproximadamente R$ 830 milhões. “Mesmo que houvesse um corte drástico no quadro de funcionários, o custo com pensionistas e outros encargos inviabiliza essa previsão de economia”, explicou o vereador, destacando que “estamos lidando com um déficit impossível de solucionar apenas com ajustes internos ou planos de demissão voluntária”.
Limites fiscais e riscos para o próximo governo
Além dos cortes drásticos, a proposta da LOA enfrenta dificuldades para se adequar à Lei de Responsabilidade Fiscal. Caso o orçamento seja alterado para garantir o cumprimento das obrigações previstas, ultrapassará o teto de gastos permitido, configurando crime de responsabilidade fiscal. Isso impactaria tanto a atual administração quanto a próxima, já que o novo governo assumiria o cargo com um orçamento deficitário.
“Ao reduzir, de forma artificial, despesas essenciais para se adequar ao teto fiscal, a proposta não reflete a realidade e coloca em risco a prestação de serviços públicos no próximo ano”, alertou Fred Procópio. Mesmo com as limitações, a orientação foi que os vereadores apresentem suas emendas impositivas dentro do prazo, na tentativa de ajustar o orçamento antes da votação final. No entanto, caso nenhuma solução seja encontrada, será necessário discutir a possibilidade de rejeitar a LOA.
Soluções possíveis seguem indefinidas
A Câmara permanece em busca de soluções jurídicas para corrigir as inconsistências da LOA, mas avalia o cenário como “extremamente desafiador”. Este não é o primeiro impasse entre o Legislativo e o Executivo em relação a matérias orçamentárias. Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, inconsistências apontadas pelos parlamentares obrigaram o governo a revisar os documentos três vezes antes de sua aprovação.
O clima entre os vereadores é de apreensão para 2025. “Se chegarmos à votação com a LOA da forma como está, será necessário um debate profundo sobre os impactos de aprová-la ou rejeitá-la”, ponderou Fred, salientando que o governo terá que tomar responsabilidade por eventuais inviabilidades financeiras no futuro. Situação que não agrada, sobretudo, o futuro prefeito.
O presidente da Comissão de Finanças, Gil Magno, reforçou que o foco no momento é adequar o orçamento, garantindo ao menos o básico para o funcionamento da administração municipal em 2025. “Não estamos medindo esforços para evitar um colapso fiscal, mas a situação exige articulação e responsabilidade de todas as partes envolvidas”, afirmou, defendendo que o Executivo e o Legislativo trabalhem juntos para evitar o agravamento da crise.